11 de jan. de 2008

Parte 07

Um vento gelado soprava forte, há algumas centenas de quilômetros do vale do Krane, sua terra natal. O sangue em suas mãos as tornava escorregadias, apenas dificultando mais ainda a escalada naquela íngreme parede rochosa. Deixara sua montaria na segurança dos campos ao pé da montanha, mesmo que ela pudesse voar, aquele era um desafio que ele deveria enfrentar sozinho, e com as próprias forças, pois precisaria se mostrar digno diante do julgamento.
O vale do Crepúsculo sempre fora um local inóspito e traiçoeiro, e já era usado pelos dragões como seu cemitério muito antes do tempo em que os primeiro elfos caminharam sobre aquele mundo. O Uialtum, como é chamado na língua do belo povo, é um valer desolado, um planalto localizado a centenas de metros cima do solo, uma terra castigada pelos deuses e onde nem mesmo os mais bravos ou os mais tolos ousam subir. O lugar perfeito para que um dragão ancião, carregando incontáveis milênios nas costas, possa ter seus momentos finais sem ser incomodado ou ter seu corpo violado por criaturas carniceiras ou mortais mercenários atrás de suas preciosas escamas.
A subida tornava-se mais cansativa e, a cada metro que deixava para trás, sua armadura parecia se tornar absurdamente mais pesada. Havia perdido completamente a noção após as primeiras horas de escalada, lembrava-se apenas de ser dia ainda quando iniciara sua empreitada rumo ao cume. Mas agora a escuridão noturna reinava suprema, embora não tivesse certeza de que já tivesse realmente anoitecido, pois não era meio dia quando as densas nuvens começaram a bloquear por completo as luz do sol. Havia um enorme simbolismo para ele naquela subida as cegas, pois deveria subir sozinho, e sem a luz do Sol, seu deus patrono, se sentia realmente sozinho.
O desgaste físico já chegava em seu limite, e o mental começava a se manifestar. Sentia a visão turvando, e aqueles ventos eternos, que se tornavam cada vez mais fortes à medida que subia, parecia sussurrar-lhe palavras de desmotivação, tentando arrancar-lhe de seu objetivo, mas o paladino não teria sua vontade vencida tão facilmente. Já enfrentara grandes perigos e desafios árduos, tivera a vida por um fio, mas nunca desistira, e não seria agora, não seria ali e nem daquele jeito que Steven Krane Sisck sucumbiria, não quando o destino de todo continente dependia daquela escalada.
O cume se aproximava. Sabia disso pelo som dos trovões que começavam acima dele e pelos flashes de luz dos raios que castigavam a íngreme parede rochosa. O derradeiro desafio ainda estava por vir, e ansiava por encontra-lo. O sangue já deixara suas extremidades há vários minutos atrás, mas sentia os próprios dedos se agarrando nas pedras pontiagudas e ásperas, ou a palma de mão ameaçando deslizar, arremessando-o para a morte certa.
Agarrou em uma pedra que julgara estar firme no lugar. Contraiu os músculos do braço, puxando o corpo para cima, porem a pedra se soltou, deixando a gravidade fazer seu trabalho e puxando o corpo cansado do paladino para baixo. Segurou firme no único apoio que ainda tinha, sentindo os dedos escorregando lentamente e se esfolando na pedra áspera, fazendo-a sangrar ainda mais. Ficou ali por alguns segundos, querendo se render ao cansaço e ao descanso momentâneo que traria a queda, antes da dor que se seguiria da paz eterna. Respirou fundo, ainda não era sua hora. Juntou as forças que lhe restavam e puxou o corpo mais uma vez para cima, achando um apoio para os pés e outro para a mão livre. Arriscou-se a olhar para baixo, mas tudo o que via era uma densa nevoa escura, então tornou a subir.
Não fazia idéia de quanto tempo levou para concluir o trajeto, sentia os olhos pesados e o corpo dolorido. Queria dormir, queria descansar. Permitira ao próprio corpo cair no chão quando encontrada um solo estável, estava agora de costas no chão, o rosto virado para o céu eternamente negro. Seus olhos ameaçaram se fechar, mas logo se abriram ao som de um trovão que cortara o céu não mais que alguns metros acima do chão. Não haveria tempo para descansar. Levantou-se e esfregou os olhos, finalmente tendo uma visão geral do vale.
O Vale do Crepúsculo merecia esse nome. Rios de lava jorravam de enormes aberturas em pequenos morros e percorriam um longo caminho até encontrarem fissuras no chão por onde voltavam às entranhas da montanha. Os rio de rocha fervente dava uma coloração avermelhada às nuvens negras acima deles, lembrando uma versão distorcida do crepúsculo. Os ventos gélidos que castigavam sem perdão a encosta da montanha já não se arriscavam mais a soprar naquela região árida e desolada do cume.
Reuniu as poucas forças que ainda guardava o corpo e iniciou sua caminhada. O cheio de enxofre que exalava das fontes de magma começava a se misturar ao cheiro pútrido das carcaças de dragão que ao pouco começavam a surgir. Criaturas tão majestosas e poderosas como os senhores dos répteis, que viviam milênios antes de alcanças seus últimos dias, e que muitos julgam serem imortais, encontravam naquele vale o local de seu ultimo suspiro, deixando apenas a prova de que a morte é a única e verdadeira certeza no mundo.
Caminhou, quase que se arrastando, em busca de um local especifico naquele cenário que parecia mudar apenas a posição e estado de decomposição das carcaças. Seguiu seus passos sem hesitação, parecia saber exatamente aonde ia, mesmo nunca tendo estado naquele lugar. Caminhou por vários minutos, embora tenham parecido horas por causa do peso de sua armadura e o desgaste físico.
Seus olhos brilharam e seu corpo pareceu se encher de uma nova energia, deixando o cansaço de lado ao encontrar o lugar que procurava. Aquela parte especifica do vale era um oásis naquele ambiente hostil. A terra ali não era árida, ao contrario, possuía uma grama baixa crescendo em volta de uma única fonte de água que brotava gentilmente de uma fonte natural. O ar ali era fresco, ao contrario do ar carregado que dominava o vale, e as nuvens se dissipavam quase que magicamente em cima daquele pequeno pedaço de paraíso.
O paladino pode ver que o dia começava a nascer novamente, e seu deus o agraciava mais uma vez com sua presença. O homem tirou seu elmo, deixando cair os cabelos dourados que aos poucos iam deixando sua cabeça. Seu rosto começava a ser tomado pela idade, embora aparentasse ser menos velho do que realmente era, mas isso parecia ressaltar ainda mais sua bondade e nobreza. Deixou o elmo cair na grama e caminhou até a fonte, não mais parecendo um homem cansado, mas um jovem guerreiro pronto para enfrentar sua batalha mais importante.
Parou em frente a uma pequena piscina que se formava abaixo da fonte, cuja água límpida refletia perfeitamente o céu acima das nuvens negras, que aos poucos assumia sua coloração azulada. O paladino se ajoelhou e olhou para dentro da piscina por alguns segundos. Então fechou os olhos e deixou que a voz imponente ecoasse em sua mente.
-Você demorou, Steven Krane Sisck V! Filho de Steven Krane Sisck IV e neto de Philip Krane Sisck II! Estive esperando por você.

2 comentários:

Gabi Gabriela disse...

melhor personagem até agora

Éb disse...

eu também achava que dragões eram imortais mas essa é de fato a única certeza.
o terry vai ficar órfão? tadinha da sra krane de qualquer forma =0
tô adorando, xé! \o/