12 de jan. de 2008

Parte 08

Os longos cabelos prateados quase tocavam o chão enquanto ele se abaixava para ver melhor algum sinal do rastro que seguia. Havia perdido seu sinal havia dois dias, por causa do infeliz incidente que a dera um tempo considerável de vantagem. Não se importava com o preconceito que sofria, estava mais que acostumado e, na maioria dos casos, as outras pessoas tinham razão em sentir medo e raiva, mas aquele homem fora bem gentil ao enxergar alem de sua aparência. Nem mesmo Tabael, a raposa prateada que o acompanhava, encontrava dificuldades em achar o rastro. “Maldita” pensou ele, já fazia meses que brincavam de gato e rata, mas ele não desistiria tão fácil, tinha certeza de que a encontraria na próxima cidade. Levantou-se e enxergou o caminho através da escuridão noturna, ele estava na vantagem, pois mesmo ela tendo uma visão extraordinária no escuro, nada substituiria a evolução natural que sua raça sofrera durante as eras nos subterrâneos.
Afastou os cabelos prateados, cujo luar dava um brilho pálido e belo, com os dedos negros e voltou a caminhar com Tabael ao seu lado. O animal, que há muito tempo já havia se tornado sua amiga, seguia na frente, sempre atenta a qualquer som suspeito que poderia representar algum perigo ao seu mestre. As raposas prateadas eram criaturas raras, existentes apenas nas planícies geladas de Tundralva, localizadas no extremo norte do continente. Animais que venciam em tamanho, força e agilidade qualquer um de seus primos de terras mais quentes. Eram pouco menores que os grandes tigres dentes-de-sabre das regiões ermas, mas caçadores igualmente hábeis e selvagens, não havia registros anteriores de qualquer uma que tivesse sido domada antes, a única exceção era Tabael.
A caçada continuou noite adentro, até que os primeiros raios dourados do sol lambessem a terra com seu calor matutino. Era hora de descansar. Seguia a oeste, e o sol agora nascia a sua frente fazendo com que seus olhos, sensíveis a qualquer luz forte, ardessem, forçando-o a fazer uma pausa. Uma das maiores adaptações de seu povo aos subterrâneos se mostravam sua maior fraqueza na superfície, pois, por mais que ele já estivesse acostumado com a luz do dia, não tinha condições de seguir seu percurso enfrentando diretamente o poderoso deus Sol.
Armou seu rápido acampamento afastado da estrada principal, não poderia correr o risco de ser avistado e atacado, coisa que poderia acontecer simplesmente por ter nascido entre a raça dos elfos subterrâneos. Os Drow, ou Elfos Negros, pouco diferiam fisicamente de seus primos da superfície alem da cor de suas peles, negra para si misturarem à escuridão das profundezas da terra, e dos cabelos, estes de uma brancura tão pura quanto à das primeiras neves do inverno. Era em suas almas, porem, onde residia a grande diferença, e o que os tornava tão odiados na superfície, e temidos em sua terra natal. Os drow eram criaturas vis, matando impiedosamente as outras raças pelo simples fato de que, para eles, nenhuma outra raça deveria existir.
Finalmente se deu ao luxo de se acomodar dentro de sua tenda, feita da pele grossa dos bisões polares para evitar o máximo qualquer luminosidade externa. Tabael arfava ao seu lado, os belos e longos pelos prateados da raposa haviam caído, revelando uma pelagem mais curta e fina, quando cruzaram as fronteiras meridionais de Tundralva e entraram em terras mais quentes, mas ela ainda não havia se acostumado com a temperatura. O drow levou sua mão até a cabeça de Tabael para acaricia-la. A raposa se aproximou de seu mestre, apoiando a cabeça em sua coxa e fechando os olhos lentamente. Seldszar Phaerin apoiou a cabeça na mochila de viagem que usava como travesseiro improvisado e imitou o gesto de sua companheira, fechando os olhos, e se aprofundando na meditação profunda que era o mais próximo que sua espécie chegava do sono, e não eram preciso mais que algumas poucas horas para se recuperar por completo.
Seus pensamentos voaram, voaram de volta para as terras ao extremo norte, e o único lugar que se atreveu a chamar de lar desde sua fuga dos subterrâneos. Pensou na cidade de Fornurta, o Esconderijo do Norte na língua de seus primos, e a única cidade élfica em toda a região de Tundralva. A cidade de cristal, como era conhecia pelas tribos nômades do norte, fora totalmente esculpida no gelo, com suas formas curvas e beleza do artesanato élfico. Lembrou-se de como encontrara a cidade ao acaso quando ainda era apenas um jovem drow fugindo, como tantos outros já fizeram antes, das garras opressoras das Matriarcas e da crueldade inata de seu povo. Os primeiros anos foram os mais difíceis. Havia sido capturado pela guarda da cidade e levado para interrogatório. Já tivera sorte o bastante em não ter sido morto, mas não escapou das torturas, que nada era comparado ao que sofrera em sua terra natal. Aceitara o castigo sem abrir a boca para reclamar, para ele aquilo era uma espécie de redenção, uma meio de tirar de si mesmo toda a maldade que nascera com ele por ser o que era. Vários anos, que pouco significam para os elfos, se passaram antes que o liberassem de sua prisão e o deixassem “livre”. Não era mais que tolerado pelos habitantes de Fornurta, embora vivesse isolado na periferia da cidade, e próximo à prisão que lhe servira de lar nos anos anteriores.
Foi então que um dia que a guarda real praticamente o arrancou de sua cama numa manhã gelada de inverno. O inverno cruel de Tundralva que castigava as planícies pálidas do lado de fora das enormes muralhas de gelo da cidade. O jovem drow havia sido pego desprevenido, não entendia o motivo de sua nova prisão, pois nada havia feito para desrespeitar as leis nem os habitantes de Fornurta, embora ele desconhecesse o respeito por parte de seus primos.
Quando finalmente se deu conta de onde estava, se viu ajoelhado diante do rei Eleandor, que o encarava com uma calma digna dos grandes reis élficos. Fez um sinal para que seus guardas os deixassem, hesitaram por um instante, mas não ousaram desrespeitar as ordens de seu rei. O imponente elfo se aproximou do drow e pediu desculpas pela atitude rude de seus guardas. O rei fora direto ao ponto quando começou a explicar para Seldszar o porque de sua presença ali. Em resumo, o rei precisava de um batedor habilidoso e de um espião de grande afinidade com as sombras, pois ouvira rumores de que um golpe de estado estava a caminho, e ele acreditava que o drow seria perfeito para o trabalho. Seldszar aceitou de imediato, honrado com a oportunidade e confiança que o rei depositara nele. Eram raras as pessoas que conseguiam enxergar o fundo de sua alma e vê-la tão cristalina quanto as nascentes que abastecem Fornurta. Havia encontrado algumas dessas pessoas, a primeira fora o rei Eleandor, confiando-lhe seu trono. A ultima, até o momento, fora o paladino Krane Sisck, que o salvara da ira selvagem dos habitantes de uma pequena vila à leste dali, e sabia, de certa forma, que não seria a ultima vez que o veria. Seus pensamentos voaram, até começarem a se desvencilhar de qualquer lógica, e então, finalmente, o drow deixou o que sua mente divagasse pelos campos oníricos e adormeceu.

Um comentário:

Éb disse...

eeee, chegou a parte dele! *-* *abanando bandeirinha escrito "Drow"*
mas será que ele vai ver o Krane ainda vivo? =0